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Eu detestava ter o meu cabelo.
Ele ia sempre preso. 
Isso porque se ficasse solto, falavam "pixaim" ou me chamavam de Elba Ramalho ou Gal ("o cabelo dela fica igual ao da Elba né?" seguido de um sorriso amarelo)... Enfim, sempre tinha alguém pra falar alguma coisa. E na verdade, até antes de EUZINHA me incomodar com MEU cabelo, alguém se incomodava por mim. A hora de "desembarassar" era um pesadelo. Terminava o banho e lá vinha minha mãe com a escova, o pente e o Neutrox ou o Yamasterol. 

Esperança mesmo só quando enrolava o bobs ou fazia uma touca no cabelo (que dormia atochado de creme e dentro de um lenço enrolado na cabeça) e o cabelo amanhecia com volume menor e mais domável. Mas, no meio do dia já tava "armado" de novo...

Eu tinha uma tia, a Zélia, uma mulher negra retinta, sambista (que só hoje entendo o significado disso) e que vivia querendo fazer uns penteados "diferentes" no meu cabelo. Sabe... umas tranças, uns coques... e eu chorava, raramente deixava… aquilo me dava vergonha... normalmente, eu não deixava não. Pensava em mim, chegando na escola e chamando a atenção. Queria só paz e que ninguém ficasse comentando nada sobre o meu cabelo ruim.

O que eu queria mesmo ter o cabelo da Jéssica minha vizinha, que era liso e escorrido até a cintura e os meninos gostavam dela. Eu tava sempre brincando, não ligava muito para isso mas... no fundo, aquilo me incomodava, me dava inveja. Por que eles gostavam dela? Por que eu não chamava a atenção assim? Eu concluía então que era porque ela era linda e eu era feia. Porque o cabelo liso dela era lindo e o meu, era feio. Eu chegava ao cúmulo de comparar o meu ao de outras meninas negras e dar graças a Deus que não era tão "duro" quanto o delas. 

Acredito que foi assim que essa auto-imagem começou a ser (des)(cons)truída.

Por que meu cabelo era ruim? 
Porque provavelmente eu era ruim também.

Eu não sabia nada de genética, mas na minha cabecinha de criança comecei a perceber que de uma cabeça como a minha só brotava algo ruim.

Demorei anos e muitos anos ainda para entender ser possível ser bonita com meus cachos, com os meus cabelos do jeito que eram. Infelizmente, essa foi uma descoberta solitária. Não, infelizmente, não tenho uma família de gente esclarecida e empoderada não... na minha família rola um machismo insano, brotam uns reaças por lá, racistas (negros, pardos e brancos) muitas e muitas vezes. Óbvio que tem o pessoal de bem, são todos trabalhadores já que são toooodos classe média baixa. Não culpo ninguém não, ok? Mas, tenho certeza de que o meio influencia a forma de nos vermos e encararmos o mundo. INFLUENCIA, mas ainda bem, não DETERMINA. 

Chegar ao ponto de ter consciência disso é algo que eu atribuo somente a mim e a mais ninguém. 

Enfim, não dei a sorte grande de estar rodeada dessas referências pra frentex, isso era anos 80 (comeco dos 90), cresci nesse período de Brasil saindo da ditadura militar e, na minha casa, a gente contava os dias pro momento em que poderíamos alisar o cabelo com alisabel. E, sim, é um fato que alisaram o meu cabelo por uns 4 anos... Não sem antes, claro, cortarem as nossas longas madeixas encaracoladas a praticamente zero..... De Gal a Sinead O'Connor. Aos 11 anos. Assim que cresceram, tascaram Alisabel. O mal do cabelo ruim não poderia reinar, hahahaha. E foram semanas e semanas alisando e enrolando bobs, queimando a cabeça naqueles secadores de cabelo de astronauta em salões cheios de tias brancas conservadoras que aplaudiam a tortura adolescente.

Talvez ali se consolidasse a destruição da minha auto-imagem: quando me fizeram acreditar que deixar o cabelo liso, me tornaria mais branca, mais imperceptível na sociedade racista, mais aceitável pelos colegas do sexo oposto... me modificar daquela forma me tornaria algo que eu não era, mas que era tragável pela sociedade...

Eu pedi para parar quando um centímetro de cabelo da parte da frente se dissolveu, fiquei careca naquele parte da cabeça e foi horrível o período de crescimento.

Aos 16 é que tive meu primeiro insight de que poderia deixar meu cabelo ser quem ele era. 
Foi um período difícil até tudo crescer e eu tirar as pontas alisadas. 
E só aí, eu me olhava no espelho melhor. 
Podia tomar chuva sem pensar que morreria por perder a escova e o alisamento!!!

Quando entrei para faculdade, a única crítica que recebia era por entuchar os cabelos de creme de pentear. Naquela época, lançaram um produto chamado Seda Hidraloe que veio para salvar a minha vida. Muito melhor que o Yamasterol, a meu ver. Mas demorei tempos e tempos para perceber que meu cabelo caia muito com aquele creme.

Os amigos gays me ajudaram muito, me incentivando a usar os cachos soltos, mas eu continuava entuchando Hidraloe e pensando que diminuir o volume era a solução. Mas, tava lá, resistente, usando cachinhos da forma que era possível usar. Uma grande amiga me chama de Cachinhos, como apelido, até hoje.

O importante é que nunca mais usei química no cabelo. Nem pintura, sabe?
E o mais importante é que há bastante tempo, desapeguei de vez dessa coisa de tentar agradar com o cabelo. E o primordial é me sentir tão à vontade de orgulhosa de ter as madeixas que tenho e dedicar uma parte do meu dia e da minha semana a cuidar deles, fazendo um cronograma capilar. Hidratando, umectando, restaurando, nutrindo... 

Meus filhos nasceram de cabelo liso. 
Eles não passarão pelo que eu passei ou passo. Por serem homens e por terem os cabelos lisos.

Mas, para todos os que estão ao meu redor a minha palavra é de empoderamento, de encorajamento.

Cuidem dos seus cabelos, das suas identidades, dos seus corações e dos seus cérebros. Vivemos num país miscigenado onde há espaço para todos ainda que para isso seja necessário lutar, resistir. Mantenham suas características, valorizem-se. Estejam, sejam, batam o pé, não esmoreçam.

Eu agradeço demais a quem tá do meu lado nisso, às amigas e amigos que ainda abrem os meus olhos recém-acordados e que me empoderam para ser autêntica, sempre. E digo, apesar de ser difícil apagar as marcas das experiências… com o tempo vou percebendo ser isso que nos faz úteis nessa vida: servir de exemplo, espalhar o exemplo, observar e empoderar...

As imagens vieram daqui e daqui 








eu sempre fui avessa às militâncias em algumas frentes por conta da minha falta de paciência para determinados embates, posicionamentos extremistas, posicionamentos vitimistas e ainda mais... porque inevitávelmente a militância acaba perdendo seu carater de luta para se tornar uma questão de embate político dentro do próprio movimento de militância. nessa hora, todos perdem.

falo isso sem medo de especificar o tema do qual falo porque acho que isso vale como um todo, para todos os movimentos. fato é que me dá preguiça.

mas, sabe...
depois que entrei nessa de descobrir que sou negra, já velha (parece absurdo mas...) e ir em busca de mais contato com as minhas raízes... o próprio contato com a capoeira e com as tradições orais africanas... não sei. mil questões e leituras entraram em pauta na minha já corrida rotina. questões de gênero, de raça... questões de posicionamento político, de moral e bons costumes, rsrs sabe como é?

E num geral, ter conhecimentos sobre isso me trouxe duas reflexões:

1. fica mais fácil lidar com as dificuldades diárias quando vc abre possibilidade para a origem das próprias dificuldades. às vezes, não é vc. ponto. às vezes é o sistema, é o macro que influencia (positiva ou negativamente) nas escolhas que vc faz. saber disso é bom: ajuda a aliviar a culpa (vivemos numa geração/cultura em que a culpa é primordial como sentimento de base) e ajuda também a encontrar alternativas mais eficazes para obter o que se quer.

2. como realmente as coisas ficam mais difíceis quando se está numa posição de marginalização. ultrapassar a linha do "vc é dono do seu nariz", "faça vc mesmo, "lute pelos seus sonhos", "você é o que você come" e coisas do gênero... caramba, é um esforço tremendo o de ignorar suas origens e sua realidade ao redor e virar o jogo numa sociedade onde tudo conspira e se esforça para que vc não seja diferente e simplesmente "se torne uma estatística".

Então, hoje, eu ainda acredito que não tenho paciência para embates políticos, ainda vivo um pouco à margem com um certo receio em me expor à discussões f'rívolas e inúteis mas....

MAS

Acredito piamente que a militância é necessária.
Por que, para mudar algo, é necessário um QUÊ de radicalismo e força... até uma certa brutalidade.
Afinal de contas, hoje a gente vive o racismo, o machismo, o elitismo já estabelecidos e enraizados de tal forma em nossa educação e cultura que sequer o percebemos... Mas, não foi de graça que as coisas ficaram assim... Foi necessário forçar a barra, foi na base de muita violência e desrespeito e mais que tudo, foi necessário muito TEMPO para que isso acontecesse.

No caso do Brasil, uns 400 anos de escravidão expressa, um verdadeiro holocausto em torno da população indígena que vivia do seu jeito por aqui... foi necessária muita aculturação, calar muitas revoluções, revoltas e até expressões religiosas e artísticas durante muito e muito tempo... sem contar na cultura machista e arrogante que veio dar lugar a tudo isso, durante a nossa colonização... enfim...

Hoje em dia, ler a respeito do feminismo e das questões relacionadas ao negro brasileiro (e americano, em geral) tem feito bem pra mim. A culpa pela impotência de realizar algumas coisas, alguns sonhos inclusive, diminuiu bastante e a compreensão de certas reações, relações e etc se fez muito mais ampla.

Eu pretendo falar disso um pouco mais aqui durante essa nova fase do blog.
Vamos vendo como as coisas se desenrolam.


"a capoeira me conecta ao saber, ao valor da palavra, à transmissão do conhecimento entre gerações através do contato humano, universaliza o movimento do meu corpo, valoriza o olho no olho, desperta o alerta e a minha capacidade de reação.

a capoeira me lembra a cada segundo que a música e o canto têm poder e lavam a alma e que, combinados ao movimento dos corpos criam o transe e a transformação combinada e tão perfeita que parece ensaiada a improvisação.

a capoeira resgata e ratifica o respeito aos mais velhos e mais experientes, não deixa lugar para o retruque, à resposta atravessada. Mas dá lugar aos sorrisos, aos olhos bem abertos, à brincadeira, ao vigor, ao rigor e aos apertos de mão.

na capoeira é preciso aprender o que é o respeito, a respirar diante do conflitos, a calcular os movimentos... a capoeira mostra caminhos, estimula o reflexo e não deixa esquecer que se bobear, a gente dança. e que nessa vida o que conta é saber ser generoso afinal a verdadeira superioridade se demonstra através da atitude e não do um golpe que fere e derruba o irmão...

a capoeira conecta almas e integra o passado, o presente e o futuro.
mostra que a ancestralidade está além das religiões mas, que tem seu lugar na espiritualidade elevada e na exaltação das tradições e das culturas... a capoeira exalta o negro mas, tem as portas abertas a todas as raças, a todas as crenças e a todas as formas de expressão.

a capoeira enche os meus olhos, e me prova com a lógica do "3 e 3, 6" que a leveza é, antes de tudo, essencial. e que é preciso ter graça e ginga pra uma vida ser mais e mais alegre, sem pensar nos pesares."

a imagem que ilustra o post vem daqui. liberado para uso.

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